Düsseldorf (a noite em BH!)
Anteontem, dia 1° de Marco, completaram-se CINCO anos que Ela e eu vivemos na Alemanha, em Düsseldorf. A terra da cerveja, do chucrute, salsichao, mostarda, da Oktoberfest - que acabou virando meu carnaval - Nürburgring e Hockenheim, dos museus fabulosos, Berlin, Hamburg, Frankfurt am Main - em Português de Portugal falam Francoforte do Meno - do Bodensee (lago Constança), München/Münich, Bremen, Dortmund, Leipzig e sua Hauptbahnhof - estação central - monumental, Dresden e a impressionante Frauenkirche totalmente restaurada após o bombardeio aliado desnecessário e criminoso em 1945 após o fim da guerra.
Ao invés de falar dos lugares que conheci e das coisas que fiz, contarei um pouco sobre a personalidade e cultura dos alemães. É um povo extremamente exigente, metódico, insatisfeito, culto e irritantemente organizado. Muitos se parecem com robôs pela forma como agem e pela rotina inabalável que estabelecem em suas Vidas. No trabalho então dá vontade de meter a mão quando um deles apenas segue os procedimentos de um programa ou norma sem perceber que uma solução improvisada, e muito mais rápida e eficiente, seria o ideal para aquela determinada situação.
Uma vez, em seu primeiro trabalho em terras germânicas, Ela estava de saída do escritório, com certa pressa pra pegar o ônibus e voltar pra casa quando presenciou um diálogo inusitado. Os alemães, colegas de trabalho e jamais amigos já que separam a Vida profissional da pessoal com um muro de 6 metros de altura por 2 de largura, pensavam na melhor maneira de com quem deixar a única chave da sala e ao mesmo tempo trancar a porta. Um deles ficaria até mais tarde, mas não tinha autorização pra levar a chave e não seria o primeiro a voltar no dia seguinte. Este, o primeiro, tinha a chave da porta e estava autorizado a possuí-la. Ela, com toda sua malandragem brasileira, ouviu tudo e sugeriu: por que o último a sair nao pega um envelope, coloca a chave dentro e empurra por baixo da porta?! Assim ele pode trabalhar até mais tarde, vai deixar tudo trancado e nao levará a chave pra casa. Foi como se ela desenhasse num quadro negro pela primeira vez a famosa equacao de Einstein. Ficaram abestalhados olhando em silêncio pensando "envelope é pra colocar carta e não chave". "Du bist ein Genie" foi a reação imediata de Hans Müller, o que ficaria até tarde. Thomas Fischer concordou e saiu correndo pra buscar o envelope. Ela saiu sorrindo que só ela da falta de ginga dos chucrutes, do quanto são obtusos.
Vi uma cena há algumas semanas que me impressionou também. Dois colegas de trabalho, um há 17 anos na empresa e o meu chefe há 19, olharam um pra cara do outro e se chamaram mutuamente pela primeira vez na História usando os primeiros nomes, Walter e Stefan. O idioma alemão é diferente do português, pois se usa o tratamento formal na terceira pessoa para se falar e escrever com desconhecidos, colegas de trabalho ou pessoas mais velhas. Demonstra respeito, cordialidade e uma nítida distância de segurança delimitando a intimidade de cada um. Comecei a rir na cara deles perguntando como conseguiram chamar um ao outro pelo sobrenome, Herr Ober e Herr Stein, por tanto tempo assim. Disseram que foram acostumados a viver dessa maneira e nunca param pra contestar certas coisas.
Isso me fez lembrar da facilidade impressionante com que um certo Adolf convenceu tanta gente a fazer o que fizeram sem parar pra pensar nos por ques e nas consequências daquilo tudo.
São difíceis de fazer amizade, os teutônicos. Falam baixo para que ninguém ao redor escute a conversa e fique sabendo de detalhes da Vida alheia, no caso a própria. Parece um cochicho eterno, seja no trem, no Straßenbahn, vulgo bonde, ou nas mesas dos restaurantes. Mas fazem uma algazarra gigante quando estão entre amigos, geralmente a turma do maternal que cresceu junta na 1a série, entrou no ginásio, fez o 2° grau e se separou na Universidade, mas continuaram amigos para sempre. Nos cursos superiores são apenas concorrentes brigando por um lugar ao sol no mercado de trabalho e não há muito espaço pra amigos.
Exagerei um pouco, mas não fica muito longe disso não. A vantagem é que quando ficam amigos de verdade são realmente leais e verdadeiros. Te convidam pra tudo, desde aniversário de afilhada, missa aos domingos às 10h da matina, chá da tarde com bolo, brunch, almoço, aniversário, exposição, cinema e até pra passar férias juntos ou fazer uma viagem de final de semana.
Quando um brasileiro/a se encontra com um alemão/ã não ocorre um diálogo normal e sim um interrogatório. Como somos geralmente falantes e expansivos, vamos respondendo às perguntas, mas o papo nao dá liga, como diria minha mãe. Se você conta um caso o alemão não conta outro em seguida. Fica querendo saber detalhes idiotas e desnecessários do tipo qual era a marca do pneu do carro nessa viagem que você acabara de contar. Se você responder Bridgestone ou Michelin ele vai te perguntar quantas libras tinha nos pneus dianteiros e nos traseiros. Se o extintor tava carregado e com validade até quando, se o triângulo para sinalizar acidentes estava com a luminosidade dentro da norma DIN e mais, qual foi a quilometragem rodada na viagem e o consumo do veículo.
São uns loucos, ás vezes, mas é bom morar aqui. Tem-se segurançaa e principalmente aquela sensação de segurança e de que é muito raro algo acontecer a você, seja um acidente de trânsito ou assalto. Infraestrutura de transportes fabulosa dando mobilidade as pessoas e respeitando rigorosamente o direito sagrado de cada cidadão de ir e vir quando bem entender e com quem quiser. A Vida acaba ficando mais programada, e às vezes mais previsível, já que acostuma-se a checar a previsão do tempo, programar feriados e férias com antecedências de 3 a 4 meses e por aí vai. A gente nunca faz isso no Brasil.
Me lembro que minhas melhores viagens sempre foram as de última hora. Aquelas combinadas no cachorro quente de quinta depois da boate onde um vira pro outro, entre o ketchup e a golada de Fanta, e pergunta "vai fazer o que no final de semana?!". "Nada e você?!" "Vamo pro Rio amanha a noite?! Voltamos domingo. A gente fica na casa do Bernardinho." "Claro, me pega que horas?!" E pronto, tá armada a alegria completa.
Um alemao hoje já planejou seu terceiro final de semana em Outubro. Sabe exatamente onde vai e com quem, quanto vai gastar e o que precisa levar. Irritante isso. Não dão margem para o improviso, para o inesperado, pras surpresas da Vida.
As distâncias também são, para nós brasileiros, ordens de grandeza bem diferentes quando comparadas com a Alemanha e o resto da Europa. Quando contamos que passamos o último final de semana em Berlin, indo sexta e voltando domingo como no causo carioca acima, se espantam e acham um absurdo viajar tanto tempo assim por apenas dois dias. Sao 500 km de carro ou 4 horas e pouco de trem. Mais moleza que isso só mordendo água.
E assim segue o barco por mais alguns anos. A cidade de Düsseldorf foi eleita a sexta melhor para se viver não sei por qual instituto de pesquisa. Isso é muito subjetivo. Quais foram os critérios avaliados?! Sem dúvida é uma ótima cidade, de tamanho médio com 500 mil habitantes, mas estrutura e agito cultural de metrópoles grandes como München, Hamburg e Frankfurt. Berlin é incomparável, mas ao mesmo tempo fica meio "fora de mão" em relacao ao resto da Europa Ocidental. Pra quem gosta do Leste, é a principal porta de entrada.
Ah, e viciei na Alt bier típica da cidade que é a capital da Nordrhein Westfalen, vulgo Renânia do Norte e Vestfália, e na forte mostarda também. Impossível parar de beber e comer.
1 comment:
Não resisti...
Post a Comment