Wednesday, April 29, 2009

Autômatos

Dusseldorf (Armas na veia)






































Detlev acorda todos os dias no mesmo horario. Lava o rosto, escova os dentes, coloca o terno, pega a carteira, o chicletes e algumas moedas, da um beijo na espreguicante mulher, pega a pasta preta, calca os sapatos, bota o paleto, gira as chaves e cai no Mundo. Esse modus operandi se repete em tantas outras familias alemas com pequenas variacoes.

Anda ate a estacao de metro e no curto caminho vai pensando no que escutar em seu ipod logo mais. Entra no trem rumo a estacao principal aproveitando pra comer uma barra de cereais. Silencio absoluto, a nao ser por duas garotinhas falantes e um pai de cabelos lisos e compridos idem. Ate os cachorros olham indiferentemente, como se tivessem sendo incomodados. As criancas nao sorriem. Limitam-se a olhar para um angustiado Detlev.

Sai do metro, sobe as mesmas escadas de sempre, entra no ultimo vagao por que no destino e o que fica mais perto da escada de saida, desabotoa o paleto, tira os fones, acomoda-se no assento, tira a carteira do bolso de tras colocando-a na tampa da lixeira ao lado da janela, toma um gole d'agua, posiciona a pasta preta no bagageiro sobre sua cabeca e dos demais, nao sem antes tirar um livro ou revista, senta-se, olha pela janela esperando o trem partir pontualmente as 7:54 da matina e comeca a leitura. Olha para os lados e quase todos fazem a mesma coisa, com pequenas diferencas. Uns ouvem musica, de pessima qualidade na maioria das vezes. Outros leem bons livros. Raramente se ve alguem com uma "profunda" revista de fofocas nas maos.

A viagem passa rapido com a leitura. Levanta a cabeca de quando em vez pra desfrutar o verde da primavera e os raios de sol que logo logo desaparecerao no ainda distante outono. Chega no destino, ajuda a formar uma fila dentro do trem para o desembarque. Todos caminham na mesma direcao em passos rapidos e pesados. Parecem apostar corrida. Desce escadas ate chegar no metro novamente, agora numa outra cidade. Telas grandes despejam informacoes nas mentes aparentemente abobalhadas. Engolem tudo. Detlev nao sabe se entendem ou se apenas absorvem as informacoes. Entra novamente num metro, mas agora para uma viagem curta de uma estacao.

As portas se abrem e ele caminha mais uma vez pela escada. Na sua frente tres homens usando ternos pretos carregando maletas pretas na mao direita caminham no mesmo ritmo. Parecem estar num trilho imaginario. Farao o mesmo caminho de volta a tarde. Detlev esboca um sorriso maroto. Seu terno e cinza e ele carrega a pasta preta na mao esquerda. Seu ipod reproduz Guns & Roses - Estranged, e os riffs de guitarra massageiam sua alma.

Todos caminham pelo estacionamento em direcao ao parque. Detlev muda de direcao, meio que para tentar sair do trilho imaginario e fazer seu proprio caminho. Passa sob as arvores respirando o ar puro da primavera europeia. Atravessa a avenida rapidamente e percebe que um Porsche 912 preto, ano provavel 74, vem em sua direcao. Deseja o veiculo e entra no trabalho.

Detlev ainda tem salvacao.

2 comments:

Grain de Beauté said...

interessante esse detlef... poeta, apaixonado, sempre enxergando além dos olhos. temos que conversar um dia darüberhinaus.

Dimas Souza said...

Arrazou Pedrinho... muuuito bom!